Mas o que veem estes olhos que não saberíamos ver?
Para quais espaços oníricos ou íntimos se tornam?
De quais outros lugares são testemunhas?
E querem fazê-nos crer que os anjos não tenham sexo?
Que tal então destas poses lânguidas, destes pulsos tão delicados,
destas caras e destes olhares tão suaves, destes movimentos tão sensuais,
destas pernas que se destapam,
destas formas tão carnais sob estes véus leves?
Ah, sentir bater este coração, captar uma chispa nestes olhos que não seja minha, ver enfim estes braços que se estendem atingirem o seu alvo,
aceitar estas rosas que me oferecem, sentir estes dedos apertar-se nos meus…
E desambaraçar-me destas carícias castos nestes rostos metálicos com um tato estranhamente suave que só me refletem a calor que os meus dedos insuflam neles…
E porque não sentir o vento destas asas poderosamente imóveis,
a suavidade destas penas que tremem à espera do voo,
e este voo, majestoso, irreal de facilidade,
que me levaria longe deste mundo funesto
onde esta ampulheta não seria um símbolo de nada.
Lugar: Montreal (Canadá)
Ano: 2004